O preço da corrupção e a campanha pela reforma politica

O Papa Francisco voltou a denunciar com palavras fortes o pecado da corrupção, no qual caem aqueles que têm poder material, político ou espiritual: “Os pobres pagam sempre o preço da corrupção”.“O corrupto, quando inicia a estrada da corrupção, mata, usurpa e vende-se continuamente”


Palavra de Dom Moacyr Grechi – Arcebispo Emérito de Porto Velho
Matéria 426 - Edição de Domingo – 29/6/2014

O preço da corrupção e a campanha pela reforma politica
“A pior corrupção é concentrar riqueza e gerar exclusão e fome”, dizia-nos Dom Mauro Morelli. Os dados da desigualdade social no mundo hoje segundo o Fórum Econômico Mundial de Davos demonstram o grau de insensibilidade social: 1% da população mais rica detém 46% da riqueza mundial e 85 pessoas possuem a riqueza equivalente à metade da população mundial.
De acordo com o relatório anual da FAO, atualmente há 870 milhões de pessoas com fome. E, segundo a revista Forbes, o patrimônio das 15 famílias mais ricas do Brasil (270 bilhões de reais) é 10 vezes maior que a renda de 14 milhões de grupos familiares atendidos pelo programa Bolsa Família, cujo atendimento em 2013 foi de 24 bilhões de reais.
Essa insensibilidade social, segundo o teólogo Jung Mo Sung, não nasce de algum desvio individual no campo da moral ou religioso, mas é fruto da cultura em que estão imersas essas pessoas.
O Papa Francisco voltou a denunciar com palavras fortes o pecado da corrupção, no qual caem aqueles que têm poder material, político ou espiritual: “Os pobres pagam sempre o preço da corrupção”.
“O corrupto, quando inicia a estrada da corrupção, mata, usurpa e vende-se continuamente”. Praticamente “é como se deixasse de ser uma pessoa e se tornasse uma mercadoria”. Compra e vende: “este homem custa tanto: tu podes comprá-lo e depois vendê-lo”! Para o papa, esta é a definição: “o corrupto é uma mercadoria” (L'Osservatore Romano 21/06/2014). (continua)
Para o jurista Dalmo Dallari, a corrupção é um fenômeno universal. É da pequena corrupção que decorre a grande corrupção. Muitos políticos, mandatários notoriamente corruptos, são eleitos e reeleitos com alto índice de votação. Ou seja, o próprio eleitor que fala contra a corrupção, fala contra os corruptos, vota em corruptos sabendo que são corruptos. Isso é falta de consciência política e de consciência de cidadania, e mesmo falta de consciência da responsabilidade ética implicada na vida social. Esse é o ponto de partida, é o despertar de consciência e de mentalidades que rejeitem a corrupção. Tudo deve começar por aí, mas, claro, tendo sequência no aperfeiçoamento de sistemas de controle e buscando a efetiva punição dos corruptos.
O documento de Aparecida reforça essa análise. O recrudescimento da corrupção na sociedade e no Estado envolvendo os três poderes aumenta a desconfiança do povo, fenômeno que se une a um profundo desprezo pela legalidade. Em amplos setores da população e especialmente entre os jovens cresce o desencanto pela política e particularmente pela democracia, pois as promessas de uma vida melhor e mais justa não se cumpriram ou se cumpriram só pela metade. Neste sentido, esquece-se de que a democracia e a participação política são fruto da formação que se faz realidade somente quando os cidadãos são conscientes de seus direitos e de seus deveres correspondentes.
Como lutar por uma democracia ativa menos desigual e injusta e por uma justiça incorruptível? Como combater a cultura e a prática da corrupção quando vemos crescer a construção da impunidade?
Novamente, o documento de Aparecida lança luzes. Não basta uma democracia puramente formal, fundada em procedimentos eleitorais honestos, mas é necessária uma democracia participativa baseada na promoção e respeito dos direitos humanos. Com a presença da sociedade civil assumindo seu protagonismo e de novos atores sociais como os indígenas, afro-americanos, juventude, mulheres, profissionais, uma extensa classe média e os setores marginalizados organizados, estão se criando maiores espaços de participação política e está se fortalecendo a democracia participativa. Estes grupos estão tomando consciência do poder que têm em suas mãos e da possibilidade de gerarem mudanças importantes para a conquista de políticas públicas mais justas, que revertam sua situação de exclusão (DAp 74-80).
Embora a justa ordem da sociedade e do Estado seja dever central da política, a Igreja não pode nem deve ficar à margem na luta pela justiça, alerta- nos o papa Francisco em sua primeira Exortação Apostólica “Evangelii Gaudium”. Todos os cristãos, incluindo os Pastores, são chamados a preocupar-se com a construção dum mundo melhor. É disto mesmo que se trata, pois o pensamento social da Igreja é primariamente positivo e construtivo, orienta uma ação transformadora e, neste sentido, não deixa de ser um sinal de esperança que brota do coração amoroso de Jesus Cristo (EG 183).
Desde agosto de 2013 passou a se reunir, por convite da CNBB, um conjunto de Entidades organizadas da sociedade civil, de alta representatividade, para, a partir das exigências de mudanças na política, definir uma proposta unificada de reforma política para o Brasil, que angariasse o apoio das principais forças de mobilização da sociedade em torno de um projeto de lei de iniciativa popular. A este movimento deu-se o nome de “Coalizão pela Reforma Política Democrática e Eleições Limpas”. Hoje são quase 100 entidades apoiadoras, dentre elas, a CNBB, OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), MCCE (Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral), Plataforma dos movimentos sociais, CONIC (Conselho Nac. de Igrejas Cristãs), CBJP (Comissão Brasileira de Justiça e Paz), UNE (União Nacional dos Estudantes) e UBES (União Bras. Estud. Secundaristas), ABRAMPPE (Assoc. Magistrados Procuradores e Promotores Eleitorais), CNLB (Conselho Nac. do Laicato), CONFEA (Cons. Federal de Engenharia e Agronomia), FENAJ (Federação Nac. Jornalistas), CONTAG (Confederação Nac. dos Trabalhadores na Agricultura), INESC (Inst. de Estudos Socioeconômicos), Frente Parlamentar pela Ref. Política com Participação Popular. Além disto, foi criada, recentemente, a Coalizão Parlamentar pela Reforma Política e Eleições Limpas, que soma cerca de uma centena de parlamentares apoiadores.
O Projeto de Lei de Iniciativa Popular tem como objetivo melhorar a política no Brasil, assim como ocorreu com as Leis Contra a Corrupção Eleitoral (Lei 9840/1999) e da Ficha Limpa (Lei 135/2010), que só se transformaram em lei, com a união de Entidades e pessoas de bem. Estes são os principais pontos de consenso entre as Entidades: afastar o poder econômico das eleições, através da proibição de financiamento de candidatos por empresas (pessoas jurídicas) e implantar o financiamento democrático, público e de pessoas físicas, ambos limitados. Adotar o sistema eleitoral chamado “voto transparente”, proporcional em dois turnos, pelo qual o eleitor inicialmente vota num programa partidário e posteriormente escolhe um dos nomes da lista ordenada no partido, com a participação de seus filiados, com acompanhamento da Justiça Eleitoral e do Ministério Público.
Promover a alternância de homens e mulheres nas listas de candidatos dos partidos, porque o Brasil, onde as mulheres representam 51% dos eleitores, é um País de sub-representação feminina, com apenas 9% de mulheres na política. Fortalecer a democracia participativa, através dos preceitos constitucionais do Plebiscito, Referendo e Projeto de Lei de Iniciativa Popular, de modo a permitir sua efetividade, reduzindo-se as exigências para a sua realização e ampliando suas possibilidades de concretização.
A CNBB está empenhada em coletar assinaturas em favor deste Projeto de Lei de Iniciativa Popular que propõe mudanças para a Reforma Política. Será preciso articular todas as entidades para envolver a sociedade nesse debate. A nossa luta nesse momento é a busca por mais de 1,5 milhão de assinaturas. 
A Arquidiocese de Porto Velho está intensificando neste período, a Campanha de coleta de assinaturas pela Reforma Politica em todas as paróquias; sua assinatura é apenas o primeiro passo para esta mudança, por isso, convocamos aqueles que ainda não assinaram para que participem e se unam na luta pela ampliação das conquistas democráticas.
Reformas estruturais como a reforma urbana, a reforma agrária e democratização dos meios de comunicação além de medidas relacionadas com a melhoria dos serviços públicos entre as quais a saúde, educação e transporte coletivo urbano só serão possíveis mediante ao processo de democratização do poder político no Brasil através de uma Reforma Política Democrática, com ampla participação popular. Estes pontos não exigem Projetos de Emenda Constitucionais, por isto, com menos dificuldades, eles podem ser tramitados. E se forem aprovados, teremos dado mais um passo significativo na consolidação da democracia e na qualificação da dimensão política do Brasil.

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